Pataniscas Satânicas

Pataniscas Satânicas

terça-feira, 21 de junho de 2016

Ode aos Vegans

Os vegans são irritantes? Consciência e aquecimento global? Relativismo moral?

Vamos falar sobre isso.


Eu gosto de ter razão.

É uma das minhas principais motivações na vida. É tão, tão satisfatório.

Eu sou daquele tipo de pessoas irritantes que numa conversa quando alguém menciona o Frankenstein eu não consigo impedir-me de corrigir que Frankenstein era o cientista, e que provavelmente estão a referir-se é ao Monstro do Frankenstein.

Mas ter razão numa questiúncula irrelevante acerca de factos  triviais não se compara à sensação de sentir-me moralmente superior a outra pessoa.

Porque ter razão moralmente permite-me sentir que sou intrinsecamente melhor do que a pessoa que está errada.

Eu não dou pontapés a cãezinhos fofinhos e posso criticar justiceiramente quem o faz! Posso sentir-me uma melhor pessoa do que quem o faz.


A sensação da superioridade moral é inebriante. Por um breve momento, numa questão de branco e preto, de certo e errado, eu sou a MELHOR pessoa.

É excelente para o ego.

É uma sensação que facilmente sobe à cabeça.

E é isso que me irrita nos vegetarianos/vegans.

A superioridade moral.

Sinto sempre que há ali um julgamento moral quando como um hamburger enquanto eles estão a comer relva ao meu lado.

E são tão chatos no Facebook. Se tiverem algum amigo no Facebook que seja vegetariano/vegan, de certeza que está sempre a pôr posts sobre as vantagens do vegetarianismo ou sobre algumas vacas que estão a ser injustiçadas algures.

Eu gosto de bacon! Parem de me fazer sentir mal por gostar de comer pizza cheia de queijo!

Comam a vossa alpista sossegadinhos e deixem de agir como se fosse melhores do que eu só porque não comem carne.


Sabem qual é o problema? O problema a sério?

É que eles têm razão.


O nosso corpo é pouco mais do que hidrogénio, oxigénio, carbono e azoto muito bem organizados, e na maior parte das vezes podemos substituir ou reparar a maior parte das peças. Aquilo que nos torna pessoas e aquilo que somos enquanto pessoa é a nossa Consciência.

O que nos incomoda acerca da morte é a perda da consciência, e não a perda do corpo, caso contrário continuaríamos a convidar a Tia Albertina que teve um AVC pré-frontal para vir ao jantar de Natal juntamente com o seu ventilador mecânico, para se poder babar em cima do perú.

É por isso que consideramos o homicídio um crime tão imoral: representa a extinção propositada de uma consciência humana, com todo o seu potencial e direito intrínseco a existir.

Como já vimos extensivamente nos artigos sobre Consciência Animal (Parte I, Parte II e Parte III), a maior parte dos animais, sejam macacos, gatos, vacas, lagartos ou até polvos ou insectos, possuem alguma forma de consciência. Pode ser mais ou menos complexa, mais ou menos semelhante à nossa, mas está lá.

Portanto se consideramos imoral extinguir propositadamente uma consciência humana é igualmente imoral extinguir uma consciência animal.


"Mas Gui," ouço-vos dizer "tu és uma pessoa horrível e amoral que não acredita que haja necessariamente alguma diferença significativa entre uma pedra e um bébé".

Muito bem, o argumento moral não vos convence. Eu compreendo perfeitamente.

Mas mesmo que sejam pessoas horríveis, egoístas e amorais como eu, continua a ser difícil não defender o vegetarianismo/veganismo.

Para começar, é terrivelmente ineficiente dar plantas a comer aos animais para depois podermos comer os animais, quando podíamos comer directamente as plantas.
Cerca de 1/3 de todas as plantas cultivadas e 1/3 da água potável disponível são usadas para alimentar animais. Se todo o grão que é usado na Indústria da Carne, só nos E.U.A., em vez disso fosse usado para alimentar pessoas, alimentaria cerca de 800 milhões de pessoas, ou seja, toda a população dos E.U.A. mais a população do Brazil mais a população da Rússia mais a população da Alemanha.

Com o nosso crescimento populacional, dessa maneira não vamos conseguir alimentar toda a gente.

Para além disso, e de acordo com a Organização da Comida e Agricultura das Nações Unidas, a Indústria da Carne é responsável por cerca de 14,5% das emissões de gases que contribuem para o efeito de estufa, seja pelo consumo de combustíveis associado, pelo desmatamento e destruição de florestas para pasto, seja pelos peidos das vacas.

Se os chineses conseguirem comer menos 50% de carne do que comem até agora, isso seriam menos 1 BILIÃO de toneladas de gases de efeito de estufa na atmosfera.

Portanto se queremos continuar a viver bem neste planeta durante os próximos tempos, é muito difícil defender a carne.

Pronto, está bem, os vegetarianos têm razão.

Mas escusavam de parecer tão superiores quando têm razão!


Sabem qual é o problema? O verdadeiro problema?

É que estas ideias de vegetarianismo/veganismo e o seu peso moral/ético associado são relativamente recentes na nossa sociedade.
É verdade que desde há séculos que existem pessoas que são vegetarianas, mas como fenómeno cultural é uma coisa que só recentemente começou a expandir-se em larga escala.
E isso não é algo que aconteça de um dia para o outro.

Eu só comecei realmente a ouvir falar do vegetarianismo como problema ético e ambiental, e não só uma opção dietética, por volta dos meus 20 anos. Por essa altura quase tudo o que importava acerca dos meus valores morais já estava definido.

Por outro lado, desde o momento em que nasci, que a ideia de que o racismo era uma coisa má era transversal a toda a gente.

Eu hoje fico absolutamente chocado e até surpreendido quando ainda vejo atitudes racistas à minha volta porque considero-as não só moralmente e humanamente erradas, como verdadeiramente primitivas, dignas de uma mente inferior.

Eu sinto-me moralmente superior a qualquer pessoa que seja racista. Vocês também, provavelmente.

Vamos então fazer uma experiência!


Vamos pegar todas as referências a vegetarianismo do meu primeiro rant e substituí-las por referências a racismo, e digam-me se não se sentem uma sensação inebriante de superioridade moral face a alguém que as dissesse.

"É isso que me irrita nas pessoas que não são racistas! A superioridade moral!

Sinto sempre que há ali um julgamento moral quando insulto um preto enquanto eles estão a lutar pelos direitos humanos ao meu lado.

E são tão chatos no Facebook. Se tiverem algum amigo no Facebook que não seja racista, de certeza que está sempre a pôr posts sobre como o racismo é mau ou sobre alguns pretos que estão a ser injustiçados algures.

Eu gosto de ser racista! Parem de me fazer sentir mal por gostar de insultar e diminuir outros seres humanos só por causa da cor da sua pele!

Sejam lá amigos dos pretos sossegadinhos e deixem de agir como se fosse melhores do que eu só porque não acham que são superiores a outros seres humanos de cores diferentes"


Percebem o que eu quero dizer?

Sim, os veganos comportam-se de uma forma irritantemente arrogante com a certeza da superioridade moral das suas escolhas, mas não mais do que eu me comporto arrogantemente e com superioridade moral face a pessoas racistas.

Matar seres vivos conscientes para o nosso próprio consumo e prazer não é menos moralmente censurável ou socialmente prejudicial do que o racismo, mas o impacto emocional das frases que eu escrevi ali atrás é definitivamente maior do que o das primeiras frases que eu escrevi relativamente ao vegetarianismo. Até mesmo para pessoas que são vegetarianas/veganas, arriscaria eu.

Simplesmente porque não houve tempo para que a moralidade e a ética do veganismo se torne transversal na nossa cultura.

Acredito que é só uma questão de tempo.

Bastarão uma ou duas gerações para que comer carne pareça algo tão imoral e censurável como ter escravos nos parece a nós.

Vegetarianos/veganos, vocês já ganharam, e ainda bem. Só precisam que o resto do mundo se aperceba disso, e estas coisas nunca são rápidas.

Entretanto eu vou continuar a comer bacon e hamburgers, e para isso deixo a explicação do Hank Green, que o explica muito melhor do que eu.

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